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Confissões de um cotista

Você já parou pra pensar nas cotas raciais? Clique e confira uma reflexão sobre o tema.

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.

Desde que o Brasil é Brasil – e a construção histórica deste país não faz jus à verdade – os negros foram colocados à margem da sociedade. Porque é mentira quando dizem que não existe mais racismo. O racismo está estampado nas mais banais ações da publicidade; está escancarado no discurso hegemônico que sempre encontra espaço para afastar o negro de seu orgulho; está mascarado nas ‘boas’ ações dos programas sensacionalistas da TV. E poderia recordar muitos outros equívocos da sociedade quando o assunto é refutar a dignidade de alguém por causa da sua cor.

Quando as cotas se firmaram como políticas de igualdade e afirmação racial nas universidades públicas deste país, abriu-se uma esfera de reconhecimento pelas injustiças cometidas contra os negros. Não que a desigualdade tenha sido suprimida por completo, mas aquela era uma abertura essencial para a inclusão de muitos jovens entre os universitários deste país. A palavra universitário tem um valor simbólico para qualquer estudante, especialmente quando este é dedicado ao conhecimento e a um futuro promissor. Ou quando ele, diante de todas as dificuldades sociais, consegue pisar em solo acadêmico.

O cotista deve conhecer a história. Deve reconhecer as razões pelas quais as políticas de inclusão têm sido estabelecidas neste país. E elas significam uma porta aberta para quem um dia sonhou em ocupar as fileiras de uma universidade. Os cotistas e mesmo os não cotistas deveriam saber, por exemplo, que em 1968 o General Costa e Silva promulgou, através de decreto, a Lei do Boi que concedia bolsas a filhos de fazendeiros nas escolas médias e superiores de agricultura. Era uma bolsa para os menos necessitados, assim como outros grandes descabimentos forjados com a intenção era privilegiar quem sempre foi privilegiado.

As ações afirmativas são muitas vezes criticadas. Fala-se em assistencialismo. Em outras palavras, criticam as cotas assim como um dia criticaram a Bolsa Família e o Fome Zero. Criticam pelo desejo incondicional de rechaçar as políticas do governo. O Brasil construído ao suor dos mais simples, sempre foi um senhor hegemônico. Os críticos da política de cotas deveriam antes ouvir os estudantes que saíram das margens da sociedade para o espaço agregador do conhecimento. Deveriam antes analisar as chances e as perspectivas de um jovem que reconheceu, por fim, seu lugar na sociedade.

O conhecimento é um traço tão perfeito da noção humana que permite a todos a absorção das informações, dos dados, do mundo. O fato de ser cotista não confere ao estudante mais ou menos inteligência. Mas comprova que ele tem, em sua compreensão, algo muito mais valoroso que é o conhecimento da sociedade por sua face vil e excludente. O cotista, por natureza, revive a sociologia da exclusão. Sabe de fato o que existe entre a universidade e a casa onde mora: um caminho sinuoso de incertezas e promessas malfadadas.

Cotistas graças a Deus: diriam os mais orgulhosos. Não há orgulho maior, no entanto, do que alcançar novos títulos, novos conhecimentos, novas posições sociais a partir de uma chance. E que todo estudante seja incentivado a agarra-se às chances que tem. O reconhecimento aos negros, ainda que restrito, abre espaço para a construção de um Brasil que não ignora sua história; que não ignora seus reais edificadores; que reconheça no jovem pobre ingresso na universidade um ponto de luz para a escuridão periférica da sociedade brasileira.


Publicado por: Mailson Ramos

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